A terceira temporada
Os limites e as expectativas do que pode ser um programa de rádio.
Quando dizemos que uma ideia é “pioneira”, estamos a reproduzir a linguagem militar, antiga, referente aos soldados da infantaria que desbravam caminho à frente do exército regular e que muitas vezes sofrem antecipadamente as consequências do combate. Uma sorte semelhante à dos peões no xadrez, peças essenciais mas descartáveis na grande estratégia do jogo.
Com o passar do tempo, a palavra ganha contornos imperiais e está na origem de muito do desenho do mundo que herdámos, colectivamente, e da versão da história em que os pioneiros enfrentam e conquistam lugares longínquos e desconhecidos, e ganham assim o respeito e a admiração de todos. É um adjectivo complexo, multifacetado. Como todas as conversas que acolhemos no podcast, requer de nós uma interrogação consciente e atenta, disponível para o incómodo das histórias, dos detalhes e dos seus múltiplos significados.
O Tal Podcast é, assim, mais do que pioneiro, o primeiro.
No seu formato e categoria, é o primeiro podcast independente em Portugal criado e apresentado por duas mulheres negras. A identidade cultural interessa neste contexto porque define um espaço que falta na paisagem mediática, ao mesmo tempo que o preenche com perguntas fundamentais, em voz própria, de uma forma autónoma e descomprometida. Na escuta activa de quem chega a este lugar de partilha, na entrega emocional de cada episódio, o podcast é o primeiro programa onde uma comunidade de líderes descobre a possibilidade de ir além dos temas habituais, e de reflectir honestamente sobre o seu papel e a sua influência. No encontro presencial, à queima-roupa, o podcast é o primeiro a reservar um tempo próprio e inigualável.
Entre Maio e Julho deste ano, a nossa terceira temporada revelou a profundidade e os desafios do amor - afrocentrado ou intercomunitário - a potência da descoberta artística, a influência da sexualidade no quotidiano, o reservatório imenso e o alcance das emoções da infância, para além da generosidade implícita em cada actuação, cada consulta, cada aventura.
Os episódios sucedem-se de uma forma planeada mas cuja espontaneidade é inegável, agora entrecortados por partilhas escritas que alargam os horizontes e desafiam os limites e as expectativas do que pode ser um programa de rádio.
Durante o próximo mês, nos longos dias de Verão, vamos fazer rewind e redescobrir conversas e materiais inéditos do nosso catálogo até agora. Episódios curtos e musicados, em exclusivo no Spotify e Apple Podcasts.
Ouvir os outros com a atenção devida significa necessariamente perder a pressa e a pressão do efémero, no caminho para uma maior capacidade de alojar o presente.
Nesta temporada, aprendemos também a valorizar muito essa procura - genuína - de novos tempos, novos poderes, outros adjectivos. Num mundo desencontrado, tal parece ser a única estratégia sã.
Até breve, boas férias!