Em criança entusiasmava-me aprender as “palavras difíceis” que se revelavam a partir dos ditados que a professora parecia debitar de cor. Também me entretinha com o dicionário de português, estratégico na minha caça por sinónimos e significados desconhecidos.
Já na adolescência, estendi esse meu mundo de encantamento ao território dos passatempos, que percorri em palavras cruzadas, sopas de letras, e cruzadexes. Foi igualmente nessa fase que encontrei na escrita o meu lugar de pertença e expressão de afectos, mais tarde alargado a território de prática jornalística.
Partilho este pedaço da minha história com as palavras – que replico de um dos meus cartões-de-visita profissionais – para expressar o quanto as vivo.
Hoje, por exemplo, dou por mim a pensar nas expressões de sabedoria popular que, aqui e ali, fui ouvindo e reproduzindo irreflectidamente.
Entram aqui provérbios como “quando a esmola é grande, até o santo desconfia”; “não há bela sem senão”; “amigos, amigos, negócios à parte”; “no poupar é que está o ganho”; ou “quem tudo quer, tudo perde”.
Cada um à sua maneira, todos os que cito traduzem interpretações do mundo que não reflectem o meu olhar sobre a realidade, e muitos até transmitem formas de ser e estar que sinto contrárias ao propósito da vida. Por exemplo, a crença de que devemos desconfiar do melhor que nos acontece, coloca-nos num modo de descrença – ainda que inconsciente – pouco compatível com grandes alegrias e celebrações. Do mesmo modo, porque é que querer tudo tem de ter como contrapartida sacrificar tudo? Devemos poupar nas aspirações, abdicando de oportunidades de realização, com medo do erro, ‘fracasso’ e desilusão?
Penso no quanto de nós não colocamos no tanto que dizemos, programados que estamos para disparar mecanismos automáticos, e desprogramados que somos para sentir e reflectir, e, consequentemente, para verbalizar o que sentimos e pensamos.
É assim que tantas vezes, sem nos determos nos significados, nos declaramos "perdidos de amor" ou "completamente caidinhos" por alguém, ao mesmo tempo que insistimos em nomear as nossas "caras-metades".
Sei que o sentido do que dizemos nem sempre é literal, menos ainda quando navegamos por ondas de paixão, mas como alguém que acredita no poder das palavras – potencialmente tão reparador e expansor quanto destrutivo e limitador –, procuro verbalizar Amor da forma que o quero viver.
Não quero perder-me, e sim encontrar caminhos que sozinha não consigo percorrer, consciente de que há aprendizagens que só nos chegam em casal. Também prefiro elevar-me em Amor, em vez de cair; e não deposito noutra pessoa a responsabilidade de me completar.
Enquanto esmiúço essas e outras expressões – e percebo que não quero estar louca de Amor (nada contra quem queira), antes cada vez mais consciente de mim na relação com alguém – paro numa definição que sempre me causou estranheza: Amor proibido.
Habituamo-nos a lê-la em livros, a ver e a ouvi-la em palcos e ecrãs – e até a romantizá-la –, mas acreditamos mesmo que alguém tem o poder de proibir sentimentos, por mais contrários que sejam ao que está convencionado?
Bem sei que a demonstração e a prática do Amor podem ser duramente reprimidas – e para mal do nosso mundo ainda são demasiadas vezes –, mas, no final o dia, quem nos impede de Amar a não ser nós mesmos?