Bots de Amor, Ministério do Amar
Como se fosse mais urgente conter o ódio, do que expandir o Amor.
Anda nas bocas do mundo: discutimos leis para o enquadrar; indignamo-nos com a sua colagem a discursos políticos; lamentamos a sua propagação na esfera virtual; e, aqui e ali, vemo-lo capitalizar linhas de financiamento para o seu combate.
De tanto se repetir por toda a parte, o ódio parece estar, mais do que normalizado, institucionalizado. Dedicamos-lhe tempo, foco e energia e, ao fazê-lo, desligamo-nos da força que deveríamos estar a nutrir em permanência: o Amor. A começar pelo próprio.
Como se fosse mais urgente conter o ódio, do que expandir o Amor. Ou como se o ódio exigisse especiais cuidados, e o Amor dispensasse maiores atenções.
Afinal, porque é que nos iremos preocupar com o bem (Amor) – que não prejudica ninguém –, quando é o mal (ódio) que nos ameaça, com políticas e comportamentos de combate a determinados grupos?
Defendo que devemos fazê-lo, pelo mesmo motivo por que devemos cuidar da nossa saúde e bem-estar sempre, e não apenas quando nos sentimos doentes.
Ocorre-me, por exemplo, que, em vez de nos focarmos tanto no combate aos discursos de ódio nas redes sociais, deveríamos investir na criação e disseminação de Bots de Amor.
Partilhei esta ideia há uns meses, em resposta a uma pergunta-desafio que me foi lançada pela revista “Activa”, a propósito dos 50 anos do 25 de Abril: “Como mulher, que mensagem deixaria escrita às portuguesas de 2074?”.
O pedido apanhou-me entre convulsões eleitorais, marcadas pela ascensão da extrema-direita, especialmente activa e popular num mundo virtual superpovoado de bots de ódio, através da sua propaganda, e da lógica polarizadora dos algoritmos.
Releio a minha proposta enviada para a “Activa”, e agora – já depois de confirmado o regresso de Donald Trump à Casa Branca, e numa altura em que alguns países europeus, como a Suécia e Finlândia, preparam as suas populações para a guerra (instalando um perigoso clima de medo, profundamente favorável a manipulações várias) –, penso que o prazo de intervenção que imaginei deveria ser alargado.
Uma semana de ‘Amorização’ dos nossos dias não bastaria. Mas foi esse o tempo de pulverização que comecei por idealizar.
Escrevi às portuguesas de 2074 para relatar como, em 2024, espalhámos “Bots de Amor” para salvar a Democracia – e nos salvar.
Nestes termos: “Durante uma semana, invisibilizámos todos os conteúdos discriminatórios, fossem populistas, racistas, misóginos, xenófobos ou lgbtqia+fóbicos, e expusemos todas as pessoas com presença digital em Portugal exclusivamente a histórias e dados animadores, e que nos humanizam. Foi o suficiente para evitar que a extrema-direita tomasse o poder de assalto”.
Os 1.000 caracteres que me desafiaram a escrever não me permitiram detalhar o alcance da viralização dos Bots de Amor, mas consegui perspectivar uma realização maior: a criação do Ministério do Amar.
Imagino-o com uma estrutura diversamente humana: em idades, género, etnias, culturas, orientações sexuais, religiões, habilitações, profissões, e tantas outras categorizações que, ao longo da vida, nos afastam, encerrando-nos de bolha em bolha.
Qual seria a sua pasta? Desde logo, a humanização das políticas públicas, da comunicação dos nossos governantes, e da cobertura mediática, sem esquecer a disseminação, no mundo virtual, de mais e mais Bots de Amor.
Porque as palavras que usamos importam, e é sobre elas que reflicto à saída da gravação de mais um episódio d’ O Tal Podcast. Voltarei a ele depois de o divulgarmos.
Por agora, sublinho a importância de imaginarmos novos futuros, capazes de nos libertar de formatações de desempenho que mecanizam as nossas vidas.
Se já tivemos o Ministério da Qualidade de Vida, se outros países criaram o Ministério da Felicidade, o que nos impede de inaugurar o Ministério do Amar? Assim, em verbo, para que o substantivo tenha força de acção.
Porque como alguém postava há dias: “Só faz guerras quem não sabe fazer Amor”. Amemos!