Vivemos tempos de profundas incertezas e inquietações, e carrego comigo uma preocupação que não é apenas minha, mas também das mulheres negras que me são próximas — e que me confidenciaram os seus receios.
Estou preocupada, muito preocupada. Não só por mim e pela minha família, mas por todos nós que acreditamos que as nossas vivências poderiam ser mais amorosas e conscientes. Que cultivar o respeito pela nossa humanidade deveria ser a nossa única bússola. Podem chamar-me utópica, mas acredito que é na utopia que encontramos caminhos para transformar a realidade. Viva a utopia.
O mundo em que vivemos continua a ser marcado pela violência sistémica e por estruturas de poder que conspiram contra a nossa existência plena. A ascensão e persistência de discursos políticos autoritários e divisivos reforçam essa sensação. Apesar do impacto devastador das políticas excludentes sobre minorias — especialmente mulheres negras — estas ideologias continuam a dominar o cenário global.
Nos Estados Unidos, assistimos à crescente desvalorização da diversidade, equidade e inclusão, com decisões governamentais que enfraquecem políticas de equidade racial e social. Os cortes em programas de diversidade, o ataque às ações afirmativas e a normalização de discursos contra minorias enviam uma mensagem clara: a justiça social está a ser desmontada, peça por peça. Este tipo de posicionamento político alimenta o ódio em vez do amor, legitima a exclusão em vez da inclusão e reforça desigualdades em vez de as combater. O impacto desta narrativa não se limita aos EUA; espalha-se globalmente, influenciando outros governos e contribuindo para um ambiente de crescente intolerância.
Este ciclo é perverso: líderes autoritários amplificam as suas mensagens através de plataformas que, por sua vez, lucram com a divisão e o caos que promovem. Para nós, que vivemos na interseção de opressões, esse cenário é duplamente hostil.
Mas esta preocupação é também um apelo à ação. Ignorar estas dinâmicas não é uma opção. Sei que não sou a primeira, nem serei a última, a reafirmar que precisamos de nos organizar, de nos apoiar e de criar espaços onde as nossas vozes sejam ouvidas e as nossas experiências respeitadas. Precisamos de questionar as ferramentas tecnológicas que utilizamos, exigir transparência e responsabilidade às corporações e às lideranças políticas. Acima de tudo, precisamos de continuar a esperançar e a agir — porque esperançar é perseverar, e perseverar é um ato de resistência.
Como afirma Paula Almeida no oitavo episódio desta temporada do podcast, precisamos de "esperançar o futuro", construindo um caminho guiado pela solidariedade e pela justiça. As comunidades africanas são exemplo disso: como a própria Paula diz, nelas não há exclusão, apenas inclusão. São um símbolo poderoso de acolhimento e pertença.
Na recente manifestação "Não nos encostam à parede", refleti sobre o poder das manifestações e sobre como é esperançoso ver pessoas de todas as origens e contextos unidas pela mesma causa. Percebi que manifestar é também um ato de amor pela dignidade humana.
Por mim, pelas mulheres negras que conheço e pelas que ainda virão, sigo em frente. A luta não termina, porque esperançar é perseverar — e perseverar é um ato profundo de resistência.