Novo episódio: Ana Paula Costa
“Migrar é também renascer de alguma forma, é ir-se reconstruindo”.
Presidente da Casa do Brasil de Lisboa, Ana Paula Costa conhece como poucos as políticas, práticas e leis da imigração, tema incontornável neste episódio de O Tal Podcast. “Estamos a viver um atentado a direitos conquistados”, lamenta a convidada de Georgina Angélica e Paula Cardoso, obstinadamente alicerçada nos valores de Abril. “Todo o processo democrático foi de construir um mundo que fosse igualitário e livre para todas as pessoas”.
Desde 2016 em Portugal, Ana Paula conta, nesta conversa, que veio sem planos para ficar, mas acabou rendida ao encanto de Coimbra.
Quase uma década depois, a cientista política nota que os desafios da migração mudaram muito, decalcados do momento político que se vive no país.
“Sempre existiu xenofobia, mas a animosidade de hoje, inclusive nas relações sociais interpessoais, não estava presente”, sublinha, lamentando a instrumentalização que tem sido feita das pessoas imigrantes, “usadas para expiar muito dos problemas sociais”.
O retrocesso não desvia, para já, a rota de Ana Paula, que tem o sangue da resistência e resiliência a correr-lhe nas veias. “A minha avó ficou viúva com cinco filhas. Então, teve que espalhar as meninas pelo Brasil. Depois, reuniu de novo as filhas, comprou uma casa. Eu venho dessa família, que conseguiu se reerguer numa força feminina”.
Natural de Cachoeiro de Itapemirim, berço de várias referências culturais brasileiras, como o “Rei” Roberto Carlos, a cientista política descreve a sua cidade como “muito artística, bastante influenciada pelos atores, e autores da literatura”.
Foi lá que, ainda na infância, Ana Paula se tornou Paulinha, nome que molda a sua identidade, mas que já se habituou a ouvir apenas quando está de regresso à morada de nascimento.
“Todo o mundo me chama de Ana Paula aqui em Portugal. Lembro que no início, quando ia para o Brasil, ficava meio confusa”.
Apesar de se reconhecer mais como Paulinha, a cientista política vê nas variações de tratamento mais um reflexo natural dos movimentos transatlânticos.
“Migrar é também renascer de alguma forma, é ir-se reconstruindo”.
Nesse processo haverá partes que morrem? Quais?
“A gente idealiza o processo migratório, o país, a relação que se vai construir. E quando entramos em contato com a realidade, há sempre essa morte do imaginário”.
Ao mesmo tempo, “nascem mais coisas ou se afirmam mais coisas”, reconhece Ana Paula, refletindo sobre as mudanças que foi e vai encontrando.
“Acho que migrar me fez ser muito mais brasileira”, diz, sem abdicar das suas particularidades. “Tenho um orgulho enorme de falar com esse sotaque brasileiro. É uma preservação de mim, nesse ambiente migratório”.
Educada para ser tudo aquilo a que aspira, a presidente da Casa do Brasil de Lisboa não hesita na direção. “O sentido das coisas é coletivo, porque sozinho a gente não consegue fazer nada, não há caminho possível”.
Firme na caminhada, Ana Paula Costa partilha, nesta conversa com Georgina Angélica e Paula Cardoso, alguns pesos emocionais que se carrega na bagagem da imigração, sem nunca descurar o compromisso cívico. “Quero ficar em Portugal, mas o país precisa de mudanças, e eu quero fazer parte delas, com os portugueses que trabalham para construir um país melhor”.





